Tranquei a porta como nunca antes tinha feito. Três voltas na chave superior, quatro voltas na chave inferior. Deixei a chave na mesa. Tirei os sapatos. As meias eu coloquei dentro dos sapatos. Tirei a camisa e joguei na cama. Tirei a calça e pendurei na porta do armário. Vesti uma camiseta branca e um short azul. A roupa que eu uso para dormir. Eu queria dormir.
Nem cheguei a deitar na cama. A tristeza teimava em me fazer companhia. Olhava por sobre o meu ombro querendo saber o que eu estava fazendo. Fechei a porta do quarto para tentar me esconder. Não tinha ninguém na casa. Só eu e a tristeza. Ela atrás de mim.
Sentei no chão, perto da cama. Pernas cruzadas. Costas eretas. Mãos sobre os joelhos. Como a professora do primário mandava ficar enquanto esperávamos o lanche. Queria me sentir como criança novamente. Queria esperar que a professora trouxesse o lanche. Queria ir brincar na rua com outras crianças. Queria subir em árvores.
Balancei o corpo para frente e esperei ele voltar. Balancei de novo, desta vez pro lado. Fiquei assim por muito tempo. De olhos fechados, me balançando. A tristeza me acompanhava. Balançava também. Sempre próxima. Próxima demais. Sempre atrás de mim. Nunca me encarando de frente.
Acredito que caí enquanto me balançava. Acordei no chão do quarto. As pernas encolhidas perto do peito. Os braços embaixo da cabeça. Estava tudo escuro e desfocado. O telefone, o interfone e o celular tocavam. A tristeza olhava pra mim. Ela estava na minha frente. Olhando nos meus olhos. Esperando.
Levantei. Tirei o telefone e o interfone da tomada. Desliguei o celular. Joguei a chave da porta pela janela. Seria só eu e a tristeza. Ela agora olhava pra mim. Agora eu podia enfrentá-la. Eu podia ganhar... Eu poderia ter ganho.
Talvez da próxima vez...